sábado, 21 de novembro de 2020

ECA resumido e comentado


Segue resumo elaborado sobre a Lei nº 8.069/90 e alterações, conhecida como Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Matéria que é comumente cobrada em concursos para juiz, MP ou carreiras policiais como legislação extravagante.

PRINCÍPIOS NORTEADORES:

a) Princípio do melhor interesse do menor: Deve permear toda a interpretação dos casos envolvendo crianças e adolescentes, não se atendo somente aos autos e dispositivos legais. Também prevê o debate com a figura do “juiz do menor”, onde todas as decisões devem ser fundamentadas com diálogo de dados de órgãos, tais como: Ministério Público, Defensoria Pública, Conselho Tutelar, CREAS, etc.

b) Princípio da prioridade absoluta: Sustentado no art. 227 da Constituição Federal e no art. 4º do ECA, versa sobre o dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público, da efetivação dos direitos da criança e do adolescente com a absoluta prioridade.

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

ASPECTO

ANTERIOR

ATUAL

Doutrinário

Situação Irregular

Proteção Integral

Caráter

Filantrópico

Política Pública

Fundamento

Assistencialista

Direito Subjetivo

Centralidade Local

Judiciário (Juizado de Menores)

Município

Competência Originária

União / Estados

Município

Poder Decisório

Centralidade

Participativo

Institucional

Estatal

Cogestão c/ Sociedade Civil

Organização

Piramidal

Em Rede

Gestão

Monocrática

Democrática

CONCEITO DE PRIMEIRA INFÂNCIA

Conceito criado para regulamentar as políticas públicas para as crianças de tenra idade (Lei nº 13.257/2017). Faz menção aos (6) seis primeiros anos de vida.

DISTINÇÃO ENTRE CRIANÇA E ADOLESCENTE

Está positivada no art. 2º do ECA, que, segundo a doutrina, foi utilizada para afastar a rotulação “menor”. Tem-se como criança quem tiver até 12 anos incompletos, e como adolescente, quem tiver entre 12 e 18 anos. Faz-se importante a diferenciação para a regulamentar alguns institutos, como as medidas socioeducativas, no art. 112, ECA.

DIREITOS FUNDAMENTAIS (Art. 3º, ECA)

Inerentes ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, estão assegurados à criança e ao adolescente, pela lei ou outros meios, com facilidades para o seu desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.

DIREITO À SAÚDE (Arts. 7º e 8º, ECA)

O art. 7º positiva o direito de políticas públicas voltadas para a saúde em favor da criança e do adolescente. Mas o art. 8º é mais complexo ao dar direito a todas as mulheres gestantes, políticas de saúde da mulher, planejamento reprodutivo, atenção humanizada à gravidez, parto e puerpério (pré-natal, perinatal e pós-natal), no âmbito do SUS. Demais direitos previstos nos demais parágrafos deste artigo.

DIREITO À EDUCAÇÃO (Arts. 53, 53-A e 54, ECA)

Os direitos básicos estão no art. 53 e destacam-se:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - direito de ser respeitado por seus educadores;

III - direito de contestar critérios avaliativos, podendo recorrer às instâncias escolares superiores;

IV - direito de organização e participação em entidades estudantis;

V - acesso à escola pública e gratuita, próxima de sua residência, garantindo-se vagas no mesmo estabelecimento a irmãos que frequentem a mesma etapa ou ciclo de ensino da educação básica.

Sobre os deveres da instituição de ensino e congêneres, foi aprovado o art. 53-A, que determina assegurar medidas de conscientização, prevenção e enfrentamento ao uso ou dependência de drogas ilícitas.

Quanto aos deveres do Estado, previstos no art. 54, destacam-se:

I - ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;

II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;

III - atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade;

V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI - oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador;

VII - atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

É definido como direito público subjetivo o acesso ao ensino público e obrigatório, ou seja, os pais ou responsável são obrigados a matricularem seus filhos ou pupilos na rede regular de ensino. Os dirigentes de estabelecimentos de ensino fundamental comunicarão ao Conselho Tutelar os casos de maus-tratos envolvendo seus alunos; reiteração de faltas injustificadas e de evasão escolar, esgotados os recursos escolares; e de elevados níveis de repetência.

VEDAÇÃO AO TRABALHO (Art. 60, ECA)

É proibido qualquer trabalho a menores de 14 anos de idade, a partir desta idade, poderá trabalhar na condição de aprendiz, vide o art. 402 da CLT.

CONSELHO TUTELAR

Órgão cuja competência está no art. 13 do ECA, que incidirá nos casos de suspeita ou confirmação de castigo físico, tratamento cruel ou degradante, ou de maus-tratos. Deverá ser comunicado o Conselho Tutela da respectiva localidade, sem prejuízo de outras providências legais.

JUSTIÇA DA INFÂNCIA E DA JUVENTUDE

Suas competências estão no art. 148 do ECA:

I - conhecer de representações promovidas pelo Ministério Público, para apuração de ato infracional atribuído a adolescente, aplicando as medidas cabíveis;

II - conceder a remissão, como forma de suspensão ou extinção do processo;

III - conhecer de pedidos de adoção e seus incidentes;

IV - conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209;

V - conhecer de ações decorrentes de irregularidades em entidades de atendimento, aplicando as medidas cabíveis;

VI - aplicar penalidades administrativas nos casos de infrações contra norma de proteção à criança ou adolescente;

VII - conhecer de casos encaminhados pelo Conselho Tutelar, aplicando as medidas cabíveis.

OBS: Quando se tratar de criança ou adolescente nas hipóteses do art. 98 é também competente para:

a) conhecer de pedidos de guarda e tutela;

b) conhecer de ações de destituição do poder familiar, perda ou modificação da tutela ou guarda;

c) suprir a capacidade ou o consentimento para o casamento;

d) conhecer de pedidos baseados em discordância paterna ou materna, em relação ao exercício do poder familiar;

e) conceder a emancipação, nos termos da lei civil, quando faltarem os pais;

f) designar curador especial em casos de apresentação de queixa ou representação, ou de outros procedimentos judiciais ou extrajudiciais em que haja interesses de criança ou adolescente;

g) conhecer de ações de alimentos;

h) determinar o cancelamento, a retificação e o suprimento dos registros de nascimento e óbito.

 

GUARDA E TUTELA

A guarda é o poder sobre a criança e o adolescente, sendo natural de seus pais. A colocação em família substituta pode ocorrer como medida excepcional. O detentor da guarda assume o compromisso de prestar toda a assistência, inclusive com o direito de se opor a terceiros. Não há alteração da titularidade do poder familiar, mas apenas a mudança no exercício do encargo da guarda. Além da guarda natural, também podem existir:

a) Provisória → Aquela definida pelo juiz, pelo período entre 10 e 90 dias, podendo ocorrer nos casos de tutela e adoção.

b) Derivada → De caráter provisório definida no bojo do procedimento de tutela.

c) Excepcional → Atende a situação peculiar que supre a falta eventual dos pais ou de responsável. (Ex: viagem a trabalho).

d) Fática → Àquele que detém a guarda/posse de um infante sem regularizá-la.

e) Medida Protetiva → Situação jurídica supletiva do poder familiar estabelecido por decisão judicial.

Já o instituto da tutela, este se diferencia da guarda, por não coexistir com o poder familiar. A tutela pode ser manifestada das seguintes formas:

a) Tutela Testamentária → É aquela que ocorre quando os pais manifestam o desejo, por testamento ou documento autêntico, de colocar o filho em família substituta, indicando quem será o tutor, após o falecimento de ambos. Vide o art. 37 do ECA.

b) Tutela Legítima → Não existindo a tutela testamentária pelos pais, será deferida aos parentes consanguíneos do menor de 18 anos, nesta ordem, de acordo com o art. 1.731 do Código Civil: I – Aos ascendentes, preferindo o grau mais próximo ao mais remoto; II – Aos colaterais, até o terceiro grau.

c) Tutela Dativa → É aquela definida em sentença judicial e não por nomeação por lei, na ausência de tutor testamentário ou legítimo. Pode ser requerida pelo interessado na tutela ou pelo Ministério Público.

OBS: Não é possível a entrega do filho para tutela. Este ato é incompatível com o poder familiar exercido pelos pais, que pode ser suspenso ou extintos nos casos em que a legislação civil determina, como algum descumprimento de dever dos guardiões. (arts. 22 a 24 do ECA). Os mesmos critérios que destituem o poder familiar valem para a tutela.

ADOÇÃO

É a modalidade de colocação em família substituta (art. 28, ECA) mais completa do ordenamento jurídico pátrio, visando a inserção da criança ou adolescente no seio de um novo núcleo familiar.

O direito da gestante de entregar o filho para a adoção está regulamentado no art. 19-A do ECA, em que encaminhará para a Justiça da Infância e da Juventude antes ou logo após o nascimento. Onde com sua expressa concordância (§ 2º), será encaminhada para atendimento especializado. No § 3º do mesmo artigo, o prazo para busca por família extensa (art. 25, § único), que é aquela formada por parentes com afinidade e afetividade, será de no máximo 90 dias, prorrogáveis, por igual período.

Não tendo sucesso a busca, a justiça determinará uma guarda provisória, nos termos do § 4º, também do art. 19-A do ECA. Onde os detentores desta guarda possuirão o prazo de 15 dias para propor a ação de adoção (§ 7º). Dar-se-á prazo de 180 dias para acompanhamento familiar por equipe interdisciplinar no caso de desistência do processo pelos genitores (§ 8º). Os recém-nascidos e crianças não acolhidas por suas famílias serão cadastrados para adoção no prazo de 30 dias a partir do acolhimento (§ 10).

As regras básicas estão no art. 39 do ECA, onde define a adoção como medida excepcional, ocorrendo quando esgotados todos os recursos de manutenção da criança ou do adolescente em sua família natural ou extensa (§ 1º). Também é vedada a adoção por procuração (§ 2º). O adotando deverá ter até 18 anos até a data do pedido, exceto se já estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes (art. 40, ECA).

O art. 42 do ECA impõe alguns limites no procedimento de adoção, onde pode adotar os maiores de 18 anos independentes do estado civil. O adotando não poderá ser adotado pelos seus irmãos ou ascendentes (§ 1º). Para os casos de adoção conjunta, os adotantes precisam ser casados civilmente ou que mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família (§ 2º). Sobre a diferença de idade, o adotante deverá ser pelo menos 16 anos mais velho que o adotando (§ 3º). O adotante, caso faleça durante o processo, poderá ter seu pedido deferido, desde que inequívoca sua manifestação de vontade, antes da prolação da sentença (§ 6º).

É necessário o consentimento dos pais ou do representante legal do adotando (art. 45), podendo ser dispensado em casos de pais desconhecidos ou destituídos do poder familiar. O prazo do estágio de convivência para a adoção será de 90 dias, de acordo com o art. 46. Este prazo pode ser prorrogado por igual período (§ 2º-A), assim como pode ser dispensado caso o adotando já estiver sob a guarda ou tutela do adotante por tempo suficiente (§ 1º).

O adotando tem direito de conhecer a origem biológica bem como obter acesso irrestrito ao processo quando completar 18 anos (art. 48 do ECA). Vale lembrar que a morte dos adotantes não restabelece o poder familiar dos pais naturais (art. 49, ECA).

 

MEDIDAS DE PROTEÇÃO

São aplicáveis quando da ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente, por ação ou omissão da sociedade ou do Estado, ou por abuso dos pais ou responsável e em razão da própria conduta da criança ou adolescente. São oito as medidas definidas no Estatuto da Criança e do Adolescente, no seu art. 101:

I) encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade;

II) orientação, apoio e acompanhamento temporários;

III) matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental;

IV - inclusão em serviços e programas oficiais ou comunitários de proteção, apoio e promoção da família, da criança e do adolescente;

V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial;

VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos;

VII - acolhimento institucional;

VIII - inclusão em programa de acolhimento familiar;

IX - colocação em família substituta.


MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS

São as medidas aplicáveis ao adolescente, que, depois do devido processo, foi considerado responsável pelo cometimento de um ato infracional equiparado a crime ou contravenção penal. Estas medidas são as dispostas no art. 112 do ECA, de acordo com a gravidade do ato:

I -  advertência;

II - obrigação de reparar o dano;

III - prestação de serviços à comunidade;

IV - liberdade assistida;

V - inserção em regime de semiliberdade;

VI - internação em estabelecimento educacional (Centro Socioeducativo).

OBS: Além destas medidas, poderão ser aplicadas ao adolescente (ECA, art.112, inciso VII) as medidas protetivas previstas no artigo 101, incisos I a VI.


CRIMES NO ECA:

O artigo 225 explica que o Capítulo dispõe sobre crimes praticados contra a criança e o adolescente, por ação ou omissão, sem prejuízo do disposto na legislação penal. Enquanto o artigo 226 prescreve sobre a aplicação das normas da Parte Geral do Código Penal aos crimes do ECA, além das disposições do Código de Processo Penal. E, por derradeiro, o artigo 227 define que os crimes regulados pelo ECA são de ação pública incondicionada.

No artigo 148 da presente lei, não há menção quanto à competência da Vara da Infância e Juventude em relação aos crimes contra a criança e ao adolescente. Assim, a regra geral é que a competência é da Justiça Estadual.

Todos os crimes regulados pela Lei nº 8.069/90, em regra, tem objetividade jurídica uniforme, ou seja, visam proteger os direitos da criança e do adolescente, assim como sua integridade física e psíquica. Ademais, o Estatuto também tutela o nascituro. Contudo, pode haver, de forma implícita, uma objetividade jurídica específica, que justifique uma segunda divisão.

I - Crimes relacionados a hospitais e centros de saúde (artigos 228 e 229)

Objetividade jurídica: integridade física e psíquica do recém-nascido (criança) e de seus direitos. 

II- Crimes relacionados a atos infracionais (artigos 230 a 235)

Objetividade jurídica: integridade física e psíquica do adolescente e dos direitos fundamentais previstos no ECA, quando submetido a procedimento por ato infracional. O procedimento deve obedecer os artigos 171 a 190 do diploma em tela.

III- Crimes relacionados à atuação da autoridade judiciária, membro do Ministério Público e membro do Conselho Tutelar (artigo 236)

Objetividade jurídica: tutelar os direitos da criança e do adolescente, mediante pessoas com munus de proteção, como os juízes, promotores de justiça e os membros do Conselho Tutelar (órgão encarregado de cumprir os direitos da criança e do adolescente – artigo 131).

IV - Crimes relacionados a colocação irregular em família substituta (artigos 238 e 239)

Objetividade jurídica: integridade física e psíquica do recém-nascido (criança) e de seus direitos.

V - Crimes relacionados a pornografia, sexo explícito ou exploração sexual e corrupção (artigos 240, 241, 241-A, 241-8, 241-C, 241-D, 241-E, 244-A e 244-B).

Por fim, as infrações administrativas estão previstas nos artigos 245 a 258-B do do Estatuto da Criança e do Adolescente, cominando pena de multa ao transgressor, assim como outras sanções administrativas em caso de reincidência. Conforme entendimento jurisprudencial, a multa deve ser aplicada levando-se em conta o salário-mínimo, já que extinto o salário de referência. Conforme aduz os artigo 194 a 199, são de competência do juiz da infância e da juventude.

OBS: Quanto ao sujeito passivo a receber drogas, se vendida a droga para menor de idade que consta na portaria 344, encaixará no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/2006, mas se a substância não constar na portaria 344 e causar dependência, configurará crime previsto no art. 243 do ECA, o mesmo valendo para bebidas alcóolicas.  

Referência bibliográfica

ANDREUCCI, Ricardo Antonio. Legislação Penal Especial. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

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