quinta-feira, 14 de abril de 2022

O direito de arena e o impasse nas transmissões dos jogos esportivos


INTRODUÇÃO

Em 2011, impasse entre Globo, Record, e o hoje extinto Clube dos 13 pelas cotas de TV do Campeonato Brasileiro de Futebol. Já em 2020, imbróglio entre o Flamengo e a Rede Globo no que refere à transmissão dos jogos do campeonato estadual. O desenvolvimento da exploração econômica do esporte elevou sobremaneira a imagem dos atletas frente às mídias audiovisuais, tornando imprescindível, ou mesmo inevitável, a participação daqueles nos direitos sobre a transmissão ou retransmissão dos espetáculos esportivos públicos, ao qual se convencionou denominar “direito de arena”.

O direito de arena, que vem da palavra “areia”, é o termo que é utilizado no âmbito do direito desportivo, faz menção aos tempos antigos, ao local onde os gladiadores se enfrentavam, ou com animais ferozes, onde o piso era coberto de areia. O direito de arena surgiu no Brasil com o advento da Lei 5.988/73, que regula os direitos autorais e especificadamente no direito desportivo com a Lei n.° 8.672/93 (Lei Zico).

Este direito autoral decorre de participação do atleta profissional nos lucros obtidos pela entidade esportiva com a venda da transmissão ou retransmissão dos jogos em que ele atua, seja como titular ou reserva. No direito de arena, a titularidade é da entidade de prática desportiva, ao passo que nos contratos de licença de uso de imagem a titularidade compete ao atleta.

A natureza jurídica do direito de arena sempre foi causa de polêmicas no ordenamento jurídico brasileiro, vez que considerado como direito conexo ao direito autoral ou direito de imagem. A Constituição entende o direito de arena como forma de proteção da imagem do atleta assim como também uma retribuição pecuniária pela sua utilização, em seu artigo 5º, como garantia fundamental:

“XXVIII – são assegurados, nos termos da lei:
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades desportivas;”

É possível vislumbrar que a Constituição assegura a proteção à participação individual em obras coletivas, deixando, por óbvio, a regulamentação a legislação infraconstitucional.

O QUE DETERMINA A “LEI PELÉ”

No aspecto infraconstitucional, tem-se a Lei n° 9.615/98, conhecida como “Lei Pelé”, que regula as Normais Gerais sobre o Desporto no Brasil, que no seu art. 42, determina que:

“Art. 42. Pertence às entidades de prática desportiva o direito de arena, consistente na prerrogativa exclusiva de negociar, autorizar ou proibir a captação, a fixação, a emissão, a transmissão, a retransmissão ou a reprodução de imagens, por qualquer meio ou processo, de espetáculo desportivo de que participem.” (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).
“§ 1º Salvo convenção coletiva de trabalho em contrário, 5% (cinco por cento) da receita proveniente da exploração de direitos desportivos audiovisuais serão repassados aos sindicatos de atletas profissionais, e estes distribuirão, em partes iguais, aos atletas profissionais participantes do espetáculo, como parcela de natureza civil.” (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).

É interessante notar que a redação original do parágrafo primeiro foi alterada de forma a reduzir o patamar de 20% para meros 5% do total da exploração de direitos, bem como passou a atribuir a responsabilidade do sindicato ao repasse destas verbas e a definição daquelas como de natureza civil.

RELAÇÃO TRABALHISTA X RELAÇÃO CIVIL

A questão trabalhista segue sendo uma das maiores dificuldades para os clubes quando se refere à quitação de obrigações. Salários elevados dos atletas e demais funcionários, e equiparação de contratos civis aos de trabalho. Dentre os principais litígios estão os descumprimentos referentes aos contratos de trabalho com os atletas.

O direito de imagem e o direito de arena também são temas relevantes dentro do estudo do Direito do Trabalho Desportivo. A descrição do Direito de Imagem é colocada com uma dupla acepção, possui um sentido de retrato-físico, chamado imagem-retrato, e outro de retrato-social, chamado imagem-atributo.

Ainda sobre o contrato de trabalho do atleta profissional de futebol, é citada a conceituação usada por Domingos Sávio Zainaghi, que diz que no caso do atleta profissional de futebol, o contrato deverá conter os nomes dos contratantes devidamente caracterizados, assim como a pormenorização dos componentes da remuneração, além do salário, “luvas”, “bichos”, etc. Além de mencionar os códigos, regulamentos e os estatutos técnicos e normas disciplinares a que estiverem vinculados e filiados (BERTOLO & SILVA, 2020, p. 54).

O direito de imagem e o direito de arena também são temas relevantes dentro do estudo do Direito do Trabalho Desportivo. A descrição do Direito de Imagem é colocada com uma dupla acepção, possui um sentido de retrato-físico, chamado imagem-retrato, e outro de retrato-social, chamado imagem-atributo. (BERTOLO & SILVA, 2020, p. 89-90).

Estão relacionados à representação gráfica, fotográfica ou cinematográfica de alguém assim como a forma pela qual uma pessoa é vista no meio social em que vive. O direito de explorar a imagem do atleta profissional pode ser cedido ao clube que explora suas atividades, por meio de cláusula no contrato firmado entre atleta e empregador.

Colocados os conceitos, vê-se que as principais causas de litígio entre atletas e clubes de futebol estão no não pagamento de verbas acessórias ao contrato, como “luvas” e “bichos”, mas também a cessão do direito de imagem como forma de burlar os direitos trabalhistas, onde se coloca um valor muito acima do pagamento do salário, visando esquivar-se dos encargos sociais, além do não pagamento no rateio pago aos veículos de comunicação, que por sua vez, repassam aos clubes, através das chamadas “cotas de TV”.

Tal entendimento de considerar uma forma de fraudar a legislação trabalhista e ignorando a relação contratual entre atleta e clube, justifica a alta demanda de processos na Justiça do Trabalho assim como da condenação de elevadas indenizações às equipes. Fator este que é um dos principais causadores da crise financeira dos times de futebol no Brasil.

O FRACASSO DA MP 984/2020

No dia 18 de junho, por iniciativa do Presidente da República, foi publicada a Medida Provisória 984 de 2020, que alterou preceitos da principal norma do Direito Desportivo Brasileiro, a Lei 9.615/98 (Lei Pelé). Uma das mudanças foi no regramento do direito que os clubes têm de autorizar a transmissão por radiodifusão das partidas, o chamado “direito de arena”.

Isto significa que uma emissora ou uma empresa de streaming, para transmitir um evento esportivo de futebol, não precisa mais ter acordo com os dois clubes participantes, como é feito atualmente, e apenas negociará diretamente com o mandante do jogo.

Sobre contratos de trabalho, os clubes poderiam firmar em período de 30 dias com os atletas. A Lei Pelé previa 90 dias de vínculo mínimo. A mudança valeria até 31 de dezembro de 2020, encerramento o estado de calamidade por conta da pandemia do COVID-19, que acabou postergando-se por 2021.

Os clubes médios e pequenos tendem a ganhar mais dinheiro com uma negociação livre. Mas os clubes grandes e de massa tendem a ganhar mais ainda, criando um oligopólio semelhante ao da Europa. Até onde isso será positivo? Futebol é entretenimento e a liberdade negocial é positiva, mas que pode ruir a competividade pela simples desunião e vaidade entre os clubes.

Mas com a falta de interesse do Congresso Nacional e com possíveis prejuízos a alguns emissores e clubes, a tentativa não vingou, porque o ATO DECLARATÓRIO DO PRESIDENTE DA MESA DO CONGRESSO NACIONAL Nº 133, DE 2020 encerrou a vigência da MP em questão no dia 15 de outubro, ainda em 2020. Portanto, nos termos atuais, o direito de arena segue com as regras previstas na Lei 9.615/98 (Lei Pelé).

REFERÊNCIA CITADA:

BERTOLO, José Gilmar; SILVA, Renie Serafim R. Direito do Trabalho Desportivo. 1ª ed. Leme: JH Mizuno, 2020.

 

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