INTRODUÇÃO
É comum o ato do Poder Público, através das autoridades fiscais
e aduaneiras, de apreender a carga do transportador, sendo o proprietário ou
não as mercadorias, após lavrar o auto de infração referente ao tributo
cobrado. Muitos questionamentos existem sobre a legalidade ou até mesmo a constitucionalidade
deste ato, fundamentado no Poder de Polícia que o Estado possui como prerrogativa
legal.
O Código Tributário Nacional (CTN), no seu artigo 78, prevê
o conceito legal de poder de polícia nos seguintes termos:
Art. 78, CTN: “Atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos”.
Baseando-se neste conceito, em análise direta, é que o
referido poder busca o equilíbrio entre o usufruto das liberdades individuais e
o bem comum. Sendo o objetivo é garantia a harmonia necessária para a existência
da liberdade individual e o Poder Público, onde vê-se necessária a coexistência
dessa liberdade assegurando a ordem social.
Entretanto, tal poder atribuído às autoridades do fisco não
pode ser manifestado de maneira excessiva ou desnecessária para que não se
configure a situação de “abuso de poder”. Em respeito à primazia do interesse
público sobre o privado, não cabe ao particular se opor à fiscalização, desde
que essa seja conduzida de forma lícita e regular.
De acordo com SABBAG (2008, p.348), da redação do art. 194
do CTN, que “a competência e os poderes das autoridades administrativas, que
laboram no mister fiscalizatório, estão adstritos a regramentos estipulados
pela legislação tributária”. Ou seja, de acordo com o próprio Princípio da
Legalidade, nada pode ser cobrado ou taxado se não estiver consoante com a norma
tributária.
A forma adequada para a Fazenda Pública cobrar de seus
devedores valores que lhe são devidos é por meio da ação de execução fiscal, disciplinada
na Lei nº 6.830/1980.
JURISPRUDÊNCIA:
Seguem jurisprudências atualizadas dos Tribunais sobre julgamento de apreensão de mercadorias para fins fiscais:
EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. APREENSÃO DE MERCADORIAS. INADMISSIBILIDADE DE APREENSÃO DE MERCADORIAS COMO MEIO COERCITIVO PARA PAGAMENTO DE TRIBUTOS. FISCO POSSUI MEIO PRÓPRIO PARA COBRANÇA DE SEUS CRÉDITOS. SENTENÇA EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE E SÚMULA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU CONCESSIVA DO WRIT. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS. SENTENÇA QUE CONDENA A AUTORIDADE COATORA AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. AUTORIDADE QUE ATUA NA REPRESENTAÇÃO DO ENTE PÚBLICO. ISENÇÃO DO ESTADO DE ALAGOAS AO PAGAMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO. REFORMA PARCIAL DA SENTENÇA. (Processo n. 0700191-47.2018.8.02.0032 – TJ-AL)
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REEXAME NECESSÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA REJEITADA. TRIBUTÁRIO. CABIMENTO DO MANDAMUS. PROTOCOLO CONFAZ Nº 21/2011 E DECRETO ESTADUAL Nº 13.162/2011. COMÉRCIO ELETRÔNICO. OPERAÇÕES INTERESTADUAIS. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. CONSOANTE ENTENDIMENTO PACIFICADO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, É INADMISSÍVEL A APREENSÃO DE MERCADORIAS COMO MEIO COERCITIVO PARA PAGAMENTO DE TRIBUTOS. (TJMS; AP-RN 0000814-19.2013.8.12.0043; PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL; REL. JUIZ MARCELO CÂMARA RASSLAN; DJMS 25/02/2019; PÁG. 60)
DO ENTENDIMENTO DO STF:
Sobre o que cerne as anteriormente citadas apreensões de
mercadorias para aplicar a cobrança por parte das autoridades do fisco, o
Supremo Tribunal Federal possui o seguinte entendimento em jurisprudência,
tendo por exemplo o Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços, o ICMS:
Com efeito, as empresas remetentes passaram a ter
preocupação com a dupla exigência do ICMS em suas operações interestaduais, já
que os Estados remetentes (principalmente aqueles que não aderiram ao Protocolo
ICMS n° 21/2011) continuaram a exigir o recolhimento do ICMS incidente na
operação interestadual, calculado com base na alíquota interna desse Estado
(por se tratar de mercadoria destinada a consumidor final, não contribuinte do
ICMS), e estarão obrigadas a recolher uma nova parcela do ICMS em favor dos
Estados destinatários.
O objetivo precípuo desta prática é compelir o contribuinte,
pela via transversa, ao recolhimento do ICMS, utilizando-se à evidência de um
mecanismo coercitivo de pagamento do tributo repudiado pelo nosso ordenamento
constitucional. Sob esse enfoque, a Suprema Corte já se manifestou
contrariamente a tais práticas, placitando o entendimento no sentido de ser
inadmissível a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento de
tributos (Enunciado da Súmula 323/STF). Assim, a retenção das mercadorias
equivale, ipso facto, ao confisco.
[ADI 4.628, rel. min. Luiz Fux, P, j. 17-9-2014, DJE 230 de
24-11-2014.]
Em teses de repercussão geral sobre a questão, o STF definiu
os seguintes temas:
I - É desnecessária a submissão à regra da reserva de
plenário quando a decisão judicial estiver fundada em jurisprudência do
Plenário ou em Súmula deste Supremo Tribunal Federal;
II - É inconstitucional a restrição ilegítima ao livre exercício
de atividade econômica ou profissional, quando imposta como meio de cobrança
indireta de tributos.
[Tese definida no ARE 914.045 RG, rel. min. Edson Fachin, P,
j. 15-10-2015, DJE 232 de 19-11-2015, Tema 856.]
É inconstitucional o uso de meio indireto coercitivo para
pagamento de tributo – “sanção política” –, tal qual ocorre com a exigência,
pela Administração Tributária, de fiança, garantia real ou fidejussória como
condição para impressão de notas fiscais de contribuintes com débitos tributários.
[Tese definida no RE 565.048, rel. min. Marco Aurélio, P, j.
29-5-2014, DJE 197 de 9-10-2014, Tema 31.]
DO MANDADO DE SEGURANÇA:
No caso da apreensão indevida das mercadorias, o remédio constitucional adequado será o Mandado de Segurança Tributário c/c pedido de medida liminar, impetrado, conforme novo CPC e pela Lei nº 12.016/2009 (LMS), em face de Chefe de Posto Fiscal, em decorrência de apreensão de mercadorias, motivada pela ausência de recolhimento de ICMS. Segue a sinopse jurídica da petição:
Inicialmente, demonstrou-se que o mandado de segurança fora
impetrado dentro do prazo decadencial. (LMS, art. 23). Lado outro, enfocou-se
que o ato coator se originava da retenção de mercadorias, bem assim do veículo
que as transportavam, devido ao não recolhimento de tributo (ICMS).
Afirmou-se, mais, que a parte impetrante trafegava na [rodovia em questão] quando, chegando na barreira alfandegária (Posto Fiscal Estadual da Cidade),
apresentara as notas fiscais, correspondentes aos bens transportados. Naquela
ocasião, consoante se destacou do Auto de Infração nº. 0000/2020, diz-se que “a
mercadoria se destina ao Estado de (XX)”. Por isso, devido seria o pagamento de
ICMS. Em defesa, todavia, argumentou-se havia, tão só, transferência de
mercadoria entre filiais (ou outra razão). Descabida, por isso, a exigência do
recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadoria ao presente Estado da
Federação.
Para além disso, o próprio veículo, de placas XXX-1234, de
titularidade da impetrante, de igual modo se encontra retido. Desse modo,
conforme se depreendia da prova carreada, a liberação dos bens (mercadorias e
veículo), estava condicionada ao pagamento do tributo, na espécie o ICMS.
Nesse compasso, restou-lhe perquirir seus direitos
constitucionais, mormente ao livre exercício da atividade empresarial, pela via
judicial, razão qual, pediu-se, inclusive, medida liminar. Assim, sustentou-se
existir ofensa a direito líquido e certo do autor/impetrante. (LMS, art. 5º,
inc. II) Inescusável que esse procedimento trouxe prejuízos de monta à
impetrante, constituindo-se em ato de arbitrariedade e abuso de poder.
O ato de apreensão de bens, dessa maneira, evidenciava
notória coação, eis que tem por fito compelir a impetrante, por via reflexa, ao
pagamento de pretenso débito fiscal. Pediu-se, então, ao final, medida liminar,
com suporte no art. 7º, inc. III, da Lei nº. 12.016/2009, de sorte a se
liberarem-se as mercadorias, bem assim o veículo.
FONTES:
Lei nº 12.016/2019. Lei do Mandado de Segurança – LMS.
SABBAG, Eduardo. Direito tributário. 9ª ed. São Paulo:
Premier Máxima, 2008. p.19-48.
Site do Supremo Tribunal Federal.
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